ODORES CORPORAIS E BULLYING: QUEM TEM MAU HÁLITO NÃO SENTE
Se você acompanha o blog Da Boca Pra Fora, é bem provável que você já leu sobre a fadiga olfatória. A adaptação olfativa ou fadiga olfatória acontece alguns minutos após a percepção de qualquer aroma (odor). É ele o motivo pelo qual sentimos o cheirinho do perfume no instante que passamos e, após poucos minutos, temos a sensação que todas outras pessoas estão perfumadas, menos a gente. Assim, é bem comum cometermos carregarmos no perfume a ponto de incomodar o olfato do outro, achando que iremos causar prazer com o bom cheiro.
Já em outras situações, por vezes não sabemos quando estamos com chulé, cecê ou mau hálito. Tudo isso, devido à fadiga olfatória. Ou seja: querendo ou não, quando as nossas células olfatórias entram constantemente em contato com um aroma, elas irão se adaptar e não mais sentirão o odor como outra pessoa sente. A exposição frequente a um odor nos impossibilita de reconhecermos até o nosso próprio cheiro.
O mau hálito, por exemplo, mesmo não se tratando de uma doença, é assunto de saúde pública. Mas se o mau hálito não é uma doença, o cecê ou chulé são? É claro que não! E eles são assunto de saúde pública também? São sim. Principalmente porque as pessoas não estão preparadas para buscar tratamentos para esses problemas. Elas não sabem a quem recorrer ou, ainda, desconhecem que têm o problema.
Infelizmente, atualmente alguns médicos ou cirurgiões-dentistas estão mais bem preparados para tratar a estética. Por isso, algumas vezes esses problemas podem passar despercebidos. É claro que isso não é “culpa” exclusiva dos profissionais da saúde. Ela recai sobre uma inversão de valores que coloca à frente da saúde a tão sonhada estética por parte dos nossos pacientes. E como disse, o mau hálito afeta até mesmo cirurgiões-dentistas, que desconhecem apresentar a alteração do próprio hálito.
Não é apenas questão de escovar os dentes, usar antissépticos na boca, axilas ou pés. É preciso tratamento profissional. É comunicar, com respeito, que o outro apresenta a alteração de odor. Fazer piadinha, bullying, dar chicletes ou indiretas só vai piorar a questão. Mau odor corporal só dói quando afeta o psicológico.
Você conhece alguém que tem essa dor? É certo fazer bullying?
As três alterações de odor citadas apenas sinalizam que algo não vai bem. Isso é o que chamamos de sinal. Os transtornos psicológicos que elas trazem, esses sim são sintomas que precisam, muitas vezes, do acompanhamento psicológico ou psiquiátrico. No meu consultório, onde faço diagnóstico e tratamento da halitose (mau hálito), isso é recorrente. É comum eu receber em minhas caixas de mensagens pedidos de socorro de pessoas que estão distantes do meu local de atendimento. Ou ainda de pessoas que simplesmente não têm condições financeiras para se consultarem.
São relatos de pessoas em desespero, porque não sabem mais o que fazer para resolver o mau hálito. Algumas dessas pessoas que se tornam dependentes do álcool para “fugirem” do problema, elas buscam o isolamento social, desenvolvem baixa autoestima, depressão, doenças sistêmicas decorrentes da baixa imunidade. Essas pessoas entram pra o número do desemprego, pensam em suicídio ou, como vimos na semana passada, no homicídio.
Ninguém pode julgar o adolescente, a família e o fato ocorrido aqui em Goiânia na semana passada em uma escola. Mas como profissional da saúde que trata um mau odor (halitose) que acomete trinta % da população brasileira, acredito sim que o bullying foi “a gota d’água” para o acontecimento da tragédia.
Precisamos muito respeitar o próximo, ajudar quem precisa de ajuda. Sei que é muito difícil comunicar situações de desagrado olfativo, mas acredito que as pessoas podem ser mais afetuosas. Tenha certeza que ajudar o outro é um presente duplo. É para você e para ele.